A capa do álbum prometia uma
viagem no tempo para quem o completasse. Rômulo leu aquilo e ficou louco na
banca de revistas. “Puxa! Eu sempre quis viajar no tempo!”, pensou. E usou a
mesada para comprar o livro e vinte envelopes de figurinhas.
Quando abriu o primeiro, seus
olhos brilharam: um astronauta, um pirata, um dinossauro, um mapa do tesouro e uma
tribo de homens das cavernas. Cada envelope continha cinco figuras de coisas
legais de todas as épocas e partes do mundo. O menino rapidamente abriu tudo
até formar duas pilhas no tapete do quarto: uma com os pacotinhos rasgados, e
outra com as figuras, também chamadas de cromos. Eles foram colados um a um e começaram
a dar cores ao livro em branco.
Rômulo começou a usar todo o
dinheiro que ganhava para comprar figurinhas. O álbum ia ficando mais grosso e
pesado a cada compra.
Quando descobriu colegas da
escola que também faziam a coleção, deu saltos de alegria: poderia trocar com
eles as repetidas. Fazia isso na hora do recreio, e quando já havia feito todas
as negociações possíveis, começou a jogar bafo.
Completar o álbum era uma tarefa
nada fácil. Exigia investimento, disciplina e dedicação. E que tristeza era não
conseguir encontrar aquelas figuras difíceis! Por outro lado, o menino exibia
com orgulho a rara número 26, que só ele tinha conseguido achar: um velho índio
americano sobre um cavalo negro.
Enfim, chegou o dia em que ele
foi à banca e comprou dez envelopes, com as moedas que economizou ficando sem
lanchar alguns dias. Eram cinquenta novos cromos e, infelizmente, todos
repetidos.
Com essas decepções, o objetivo
de completar o álbum foi sendo aos poucos esquecido, e em certo dia ele foi
parar dentro da gaveta, debaixo de outras revistas e papéis. Em uma mudança,
anos depois, Rômulo não se importou em se desfazer do livro incompleto, colocando-o
no lixo junto com outras coisas velhas. Afinal, já tinha deixado de acreditar
em viagens no tempo.
Rômulo tornou-se um homem e nunca
mais colecionou figurinhas. Mal lembrava que um dia havia se dedicado tanto a
isso.
Foi por acaso que, muitos anos
depois, ele viu o anúncio de venda daquele velho álbum, idêntico ao seu, com a
coleção completa. Como já estava em uma idade dada a sentimentos nostálgicos
sobre a infância, resolveu comprar - com a desculpa de mostrar ao filho.
Quando o pacote chegou pelo
correio, ele ficou um pouco envergonhado. Valia a pena gastar dinheiro com
aquilo? Contudo, ao abrir a primeira página, foi surpreendido por um turbilhão
de memórias que já o haviam abandonado: o cheiro característico daquele papel, as
instruções sobre como colar as figuras, o texto com as boas vindas da editora
ao “jovem colecionador”. A cada imagem ali colada, uma lembrança o assaltava.
“Olha só o astronauta!”, exclamou. “Esta foi a minha primeira figurinha!”.
Em todas as páginas, já um tanto amarelas
pelo tempo, vinha uma surpresa. “Não acredito! A número 100!”, gritou quando
viu, pela primeira vez na vida, o cromo do cavaleiro medieval.
Rômulo ficou horas folheando aquele
verdadeiro baú de lembranças, revivendo as inocentes idas à revistaria, as
trocas com os amigos e a alegria de conquistar uma figura nova.
Ao se dar por satisfeito, fechou o
livro com muito cuidado e voltou a admirar a capa. Lá estavam aquelas palavras
que o haviam convencido a começar a coleção: “Complete o álbum e faça uma
viagem no tempo!”
-Não era mentira... – sussurrou,
com os olhos úmidos.
Era muito bom poder voltar àquele
tempo.
É, prezado L.F., realmente o Rômulo não deixou de "viajar no tempo" (como ele tanto desejava). Ainda que com um certo atraso (o qual denominamos de "vivência e maturidade"), finalmente ele pôde, literalmente, ter seu desejo cumprido! Parabéns por mais este belo conto!!!
ResponderExcluirAdorei seu conto. Vou levar para meus alunos do 7º ano!
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