Encontraram-se na frente do
shopping, como era comum. Ela atrasou, pois havia esperado na entrada errada, o
que gerou os primeiros risos entre os dois. Decidiram ir a outro local e
caminharam alguns quarteirões – em cujo tempo ganharam alguma cumplicidade. No
caminho, Rick pensou: Ficarei hoje com ela, mas será a única vez.
Ele nunca havia feito isso.
Toda vez que alguém demonstrava interesse, ele se apaixonava. Estava cansado de
sofrer. Queria simplesmente curtir, como muitos jovens faziam. Desta vez não se
sentiria culpado por não iniciar um relacionamento sério depois de alguns
beijos. Queria apenas a diversão daquelas horas e depois dispensaria a moça,
por mais que essas palavras não caíssem muito bem.
Compraram os ingressos para o
filme que estreara, mas ainda havia uma hora para a sessão. Caminharam lado a
lado, pelas lojas de discos, conversando sobre música. Ela sempre sorridente e
falante. Havia uma luz especial nela, quase infantil. Ele estava contido, mas apreciando
o momento. Sentia como se tivesse levado uma criança para passear. Porém, a
intenção de beijar na boca não cessara, e os pequenos esbarrões que davam sem
querer na caminhada apenas aumentavam sua vontade.
Era evidente que ela também
queria. Às vezes ele a pegava encarando fixamente, por uma fração de segundo, o
admirando, mas a timidez os fazia disfarçar. Até que chegou a hora de ver o
filme.
Na sala escura, a tensão
subiu. O filme era bom, então Rick não quis tirar os olhos da tela. Mas, num
ímpeto de audácia, avançou os dedos para a poltrona ao lado e tocou a sua mão.
Foi um misto de ingenuidade com o mais alto atrevimento, e aqueles dois
quase-estranhos passaram a hora seguinte de mãos dadas, como se fossem um
casal.
Ao fim da exibição, veio a dúvida:
seguiriam segurando a mão um do outro? Ou se largariam e agiriam como se nada
tivesse acontecido? Quando as luzes acenderam e era hora de levantar, ela olhou
para ele e ficou novamente encarando, desta vez sem desviar, dizendo muito com aqueles
olhinhos puxados. Ele, compreendendo, avançou a boca para a dela e deram ali
seu primeiro beijo.
Foram segundos mágicos, como sempre
é o primeiro beijo em alguém. Quando terminou, já eram pessoas diferentes, quase
como uma só. Saíram do cinema caminhando de mãos dadas da maneira mais natural
possível.
O resto da tarde foi de muitos
beijos. Entre um e outro havia aquelas conversas triviais que os
animavam. Uma delas sobre cachorros. Descobriram que ambos tinham cães da mesma
raça: Akita. Assim, a tarde se esvaiu muito rápido, e chegou a hora da
despedida.
Diante da estação, abraçados,
a noite começava a cair. Quando a condução dela estava chegando, ele perguntou
se ela havia gostado do dia. “Muito”, respondeu. “Hoje foi muito especial”. E
aquelas palavras tinham um sabor agridoce, pois ele sabia que aquilo nunca mais
se repetiria.
Ele chegou em casa satisfeito
e pronto para a próxima. Aquela japonesinha ficaria guardada na sua memória,
mas nunca a procuraria novamente. Ela ligou dias depois, desejando um novo encontro,
mas ele disse que não podia ir, e assim perderam contato.
Passaram-se mais de vinte anos
daquele dia. Rick pensa em sua vida, e acha que, se tivesse ficado com aquela
jovem simpática e ingênua, iluminada, que estava realmente interessada nele,
muitas das suas decepções atuais teriam sido evitadas. Como seria sua vida se
tivessem casado? Onde estará a japonesa hoje? Infelizmente não há nenhuma pista
para procurá-la, e mesmo que houvesse, hoje ela não seria mais aquela moça
graciosa, como eu não sou aquele jovem e impetuoso Rick. Eu não construí nada
do que me orgulhe e, por isso minha luz se apagou. Estou envelhecido e morrendo...
Ainda bem que possuo, ao
menos, a lembrança daquele dia feliz, em que fui amado por uma jovenzinha
de olhos puxados chamada Luciane. É o que me resta: todos os dias fecho os olhos e me
transporto para aquela tarde. Foi um dia quase banal, mas que hoje tem um gosto
muito diferente.
Obrigado por este
presente. Desculpa por ter estragado tudo. Espero, com minhas últimas forças,
que a sua luz continue brilhando.
Muito bom o conto.
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