Naquele tempo, quase tudo que tinha no supermercado vinha com um brinde dentro. As latas de achocolatado traziam carrinhos. Os pacotes de salgadinho vinham com personagens do velho oeste. Nas caixas de biscoito tinha marcianos e espaçonaves. Às vezes até no café havia algum brinquedo. Mas os mais interessantes estavam dentro das caixas de cereal. Fred tornou-se fã de todos esses produtos, só para ganhar os brindes. No quarto dele tinha uma estante cheia só com esses brinquedos. E sempre que os pais iam fazer compras ele queria ir junto para certificar-se de que eles trariam os alimentos da marca certa. Seria um desperdício de dinheiro comprar uma comida que não viesse com uma surpresa dentro.
Foi em uma dessas idas ao mercado que o garoto viu uma caixa de sucrilhos em tamanho família com o desenho de vários monstros no verso. “Contém um personagem”, estava escrito na caixa. Uma das melhores sensações daquilo era o mistério em saber como exatamente era o brinde. Na caixa só havia um desenho, e não uma foto do boneco. Somente quando Fred abrisse a caixa é que saberia o que havia lá.
Não foi fácil convencer os pais a comprar aquele cereal, pois ainda tinham uma caixa quase cheia – e o menino estava enjoado de tanto comer aquilo. Mas, no fim, ele conseguiu o que queria. Ao chegar em casa, foi correndo colocar a mão nos grãos torrados de milho até encontrar o brinquedo. Quando o tirou de lá, ficou olhando admirado. Era o conde Drácula, naquela versão com capa de golas altas e rosto pálido. Pequenino, mas com perfeição nos detalhes, incluindo até os dentes pontiagudos. Assim que o viu, Fred percebeu que aquele seria seu brinquedo favorito durante semanas. Naquele dia, aonde ele fosse, levava o vampiro junto. Só se separou dele na hora de dormir, quando o depositou na estante, em pé, ao lado dos índios, dos dinossauros e dos marcianos, todos brindes do interior de alguma caixa.
Na manhã seguinte, Fred não percebeu que havia um boneco faltando em sua coleção. Estava tão feliz com o vampiro, que foi correndo brincar com ele. Levou-o até a mesa e ficou lendo o verso da caixa, enquanto sofria para engolir mais uma colherada daquele cereal. Lá estava escrito que havia cinco personagens diferentes na coleção. “Eu preciso consegui-los!”, pensou.
Como sabia que os pais não iam comprar uma caixa nova tão cedo, ele correu até seu cofre de porquinho para juntar as moedas. Tinha o suficiente para mais duas caixas! Não pensou duas vezes: foi escondido ao supermercado e correu para a mágica estante cheia de caixas de sucrilhos empilhadas, cada uma com um boneco dentro. Ficou um bom tempo escolhendo as que levaria, temendo comprar uma que viesse com o mesmo conde Drácula. Já no caminho de casa, abriu o cereal para pegar os bonecos. “Que maravilha!”, pensou, quando retirou não um, mas dois personagens diferentes do fundo da mesma caixa. Isso era raro, mas acontecia, por algum descuido da empresa. Em suas mãos agora estavam quatro monstros: além do Drácula, o Lobisomem, o Frankenstein e o monstro da Lagoa Negra. Só faltava um para ter todos!
No caminho, o menino jogou os sucrilhos em uma lata de lixo da vizinhança, pois eles não o interessavam. Em casa, brincou como nunca com o assustador quarteto, misturando-os aos marcianos e aos exploradores espaciais de outras coleções. Mais uma vez, ao fim daquele dia, todos os brinquedos foram para a estante do quarto antes de Fred ir dormir.
Naquela madrugada, o garoto teve um pesadelo. Talvez por ter passado tanto tempo brincando com seus monstrinhos, sonhou que eles iam eliminando todos os outros personagens que possuía no quarto. Assim os monstros iam crescendo cada vez mais, até ficarem do tamanho de uma pessoa de verdade. Fred acordou assustado, olhou para a estante e não viu metade dos outros brinquedos da sua coleção. Ficou confuso, tentando entender como é que eles haviam sumido. Drácula estava bem no centro, cercado pelos bonequinhos mais novos, mas além deles só restavam alguns poucos índios e um xerife sobre seu cavalo. “Tudo bem, depois eu procuro vocês”, pensou, e foi tomar mais um prato de cereal no café da manhã.
Qual seria o monstro que estava faltando para completar aquela série? Ficou tentando descobrir, olhando uma velha revista de filmes de terror, mas o único jeito de saber seria comprando mais um cereal. Porém, sem dinheiro e sem poder pedir aos pais, teria que esperar.
Os dias foram passando e, a cada noite, a coleção de brinquedos diminuía. Somente os quatro monstros reinavam na estante do garoto, cercados por poucos bonequinhos quebrados aos pés deles. Fred os procurava, mas não encontrava. “Ei, o que vocês fizeram com eles?”, perguntou aos monstros. Eles, obviamente, não responderam. Permaneceram parados, com seus rostos sombrios. Mas Fred gostava daqueles monstros, e continuou brincando com os quatro.
Quando chegou o dia do mês de fazer compras, Fred ficou animado, pois era aquela a chance de comprar o quinto personagem. No supermercado, ele foi correndo pegar uma caixa, mas assim que chegou à estante ficou extremamente desapontado. Aquela marca de cereal havia acabado. Só restavam outros, que não traziam brindes. Ele teve vontade de chorar. Nunca mais saberia qual era o quinto monstro. Estava desapontado, mas insistiu e por fim encontrou, no fundo da estante, atrás de todas as caixas novas, uma antiga, ainda da promoção dos monstros. Ficou tão feliz que saiu correndo até os pais, agarrado a ela, sem colocá-la dentro do carrinho de compras para ninguém pegar.
Em casa, abriu o cereal torcendo para não ser um boneco repetido. E, para sua alegria, não foi isso que encontrou. Mas também não era um monstro como os outros. Era um pequeno pistoleiro, com botas, chapéu e uma pistola. “Isso está certo?”, pensou, achando que haviam colocado ali um boneco errado.
De qualquer forma, era um brinquedo legal. Brincou com ele o dia todo e, antes de dormir, juntou-o aos demais na estante. Naquela noite, mais uma vez, teve pesadelos. Sonhava com lutas, gritos e tiros ao seu redor. Foi acordar muito cedo, quando os primeiros raios de sol iluminaram o quarto. Tomou um susto ao olhar sua estante e notar que ali só havia restado um boneco: justamente o pistoleiro que estava naquela última caixa de cereal. Confuso, tomou-o em suas mãos e foi para a mesa do café da manhã. Dentro daquela caixa de sucrilhos havia um folheto, que ele não tinha notado antes. Ali estava o desenho de todos os personagens daquela coleção: o conde Drácula, o monstro de Frankenstein, o Lobisomem, o monstro da Lagoa Negra e, finalmente, o mais disputado de todos: o herói Van Helsing, caçador de monstros.
Isso aconteceu há muito tempo. Hoje em dia já não colocam mais nenhum brinde nas caixas. Fred, agora um adulto, encontra por acaso o bonequinho pistoleiro, no sótão. Fica olhando aquele brinquedo todo empoeirado, e a nostalgia lhe deixa com os olhos úmidos de emoção. Aquele era o único brinde de caixas de cereal que havia sobrado de toda a sua infância.
melhor conto que eu já li
ResponderExcluirkkkk melhor conto
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