quinta-feira, junho 02, 2016

A Caixa (L.F.Riesemberg)



Michael acordou sem saber como havia chegado lá. Achava-se em um quarto de paredes brancas, sem portas ou janelas. “Veja, ele acordou”, ouviu alguém falar. Ao olhar para o lado, percebeu que outras três pessoas estavam lá dentro.

“Que lugar é este?”

Ajudando-o a levantar, uma enfermeira tentou passar tranquilidade. “Também não sabemos. Todos acordamos aqui”.

Um velho vestido como mágico e um jovem soldado do exército concordaram com a cabeça. “Estamos tão confusos quanto você”, disse o velho.

“Não consigo lembrar de nada”, disse Michael. “Fomos sequestrados ou algo do gênero?”.

“Ela já disse”, falou o soldado, com certa irritação. “Ninguém sabe de nada!”.

Michael olhou ao redor com mais atenção, tentando encontrar uma saída. Pareciam presos em uma grande caixa.

“Não adianta. Já tentamos de tudo”, disse o velho.

“Você faz mágica?”, perguntou Michael.

“Oh, não ouse fazer perguntas. Tudo o que sei é que estou aqui, vestido com este casaco e este chapéu”.

Michael tentou lembrar-se de algo, mas apesar dos esforços, nada vinha à sua mente. Não sabia quem era, nem nada sobre seu passado.

“Há quanto tempo estamos aqui?”

“Ei, o velho já não disse para não fazer perguntas? Não temos a menor ideia, sobre droga nenhuma!”, gritou o soldado.

“Por favor, mantenham a calma”, disse a enfermeira. “Temos que esperar”.

“Mas eu não quero esperar”, retrucou Michael. “Quero sair daqui”.

“E acha que já não tentamos?”, perguntou o soldado. “Essas paredes não cedem. Também não adianta gritar, porque ninguém escuta”.

Michael colou os ouvidos à parede branca, tentando ouvir algo. O único som que parecia vir do outro lado era um leve e ininterrupto tilintar, como o de um telégrafo passando uma mensagem.

“Socorro!”, gritou, golpeando as paredes. “Estamos presos aqui!”, berrou. Mas era inútil.

“Eu já disse, pessoal”, falou a enfermeira, tentando apaziguar. “Esperemos, que logo haverá uma saída”.

O velho mágico sentou no chão, encostando-se à parede. “É uma eterna espera”, disse, sem esperanças.

“Ei, e alguém nos traz água? Comida?”, perguntou Michael à enfermeira. Ela suspirou. Não sabia de nada.

“Como assim? Estamos esquecidos aqui?”, desesperou-se Michael. “Temos que sair, senão...”.

“Senão o que?”, perguntou o mágico. “Morremos?”. Então seus olhos desfocaram e seu rosto enrijeceu, como se estivesse vendo algo sinistro. “Pois eu lhes digo uma coisa: nós já estamos todos mortos, e isso aqui é o limbo”.

Silêncio tumular abateu-se sobre todos. Não queriam pensar naquela possibilidade.

“Havia outros nesta sala”, disse a enfermeira. “Mas desapareceram”.

“Como assim, desapareceram? Quem eram eles?”, perguntou Michael.

“Um menino e sua mãe. Não falavam muito”.

“E como saíram? Se foram embora, há um modo de sair”, impacientou-se Michael.

“Evaporaram”, falou o soldado.

“Sim”, concordou o mágico. “Uma hora simplesmente nos demos conta de que não estavam mais aqui”.

“Isto não pode estar acontecendo de verdade”, Michael lamentou. “Racionalmente, que outras possibilidades existem para isso tudo?”.

Todos se olharam.

“Talvez sejamos loucos em um hospício”, disse o soldado. “E estamos delirando, sob medicamentos e choques na cabeça”.

Todos ficaram pensativos. A enfermeira prosseguiu:

“Eu já imaginei que somos bonecos. Pertencemos a uma criança que cresceu e não quer mais brincar conosco”, disse ela. “Por isso estamos abandonados aqui”.

O soldado fez um gesto de escárnio. “Essa foi a pior de todas”, debochou. “É mais fácil achar que estamos dormindo e isso tudo é um pesadelo”.

Michael, intrigado, avaliou todas as teorias, mas nenhuma lhe parecia satisfatória. Precisavam fazer mais sentido. Por que justamente aquelas pessoas, naquele lugar? Ele sentia que só sairiam dali a partir do momento em que compreendessem a razão daquilo, quando todas as peças se encaixassem, de um modo preciso e engenhoso.

Ele estava certo.

Debruçado sobre a escrivaninha, Stephen encarava aturdido uma nova folha em branco presa à velha Underwood, quando sua esposa abriu a porta.

“E então, querido. Conseguiu começar?”.

Ele a mirou com decepção.

“Não, Thabita. Já escolhi os personagens, só resta saber o que fazer com eles”.

“Ei, eu pedi uma pizza”, disse ela. “Talvez depois de comer você consiga colocar as ideias no lugar”.

Ele voltou a olhar o papel.

“Oh, não, querida. Tenho prazo para entregar este livro. Mas pode me trazer uma cerveja. Ou melhor, uma caixa delas”.

Um comentário:

  1. Genial!
    O insight da relação entre a caixa de cervejas e o quarto trancado foi ótimo.

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