O
avião cortou o céu, traçando um risco branco no imenso quadro azul. Aqui
embaixo, em uma rua qualquer, Celestinha olhou para o alto e enxugou o suor.
Ela ia de casa em casa entregando panfletos de uma loja, mas parou para
contemplar a linda aeronave que rugia sob os raios dourados do Sol.
Terminado
o trabalho, a garota foi receber o pagamento. Desceu a ladeira admirando o traço
de fumaça que permanecia no céu. Os pés, dentro dos sapatos frouxos e gastos,
pisavam firmes no chão, como os de alguém que cuida para não cair e se machucar
mais uma vez.
−Eu
trouxe isto para você – disse o gerente, depois de entregar as moedas pelo
trabalho bem feito.
A
menina recebeu alegremente um livro todo surrado, com páginas já amarelas. Na
capa, um astronauta pilotava um foguete pelo espaço.
No caminho
para casa ela folheou atentamente o presente recebido. Depois de ler um pouco, já
havia chegado a uma conclusão: quando crescesse, viajaria pelo céu até chegar
às estrelas. Seria comandante de uma nave espacial, ou então de um daqueles
aviões que deixavam o céu cheio de riscos.
Em
casa, ao contar aquele novo sonho aos seus pais, ela reparou que eles se
olharam um tanto tristes.
−Boa
sorte, minha filha. Com muito estudo e dedicação, você vai chegar aonde quiser
– disse o pai.
Celestinha
ouviu o conselho e dedicou-se ao máximo, sem deixar de ajudar os pais de todas
as formas possíveis. Ela foi crescendo, formou-se, virou professora e passou a
ser chamada de Tia Celeste. Porém, os caminhos que ela podia percorrer nunca a
levaram ao céu. Ao invés de foguetes ou aviões, usava livros para conduzir seus
pequenos passageiros.
Um
dia, seus velhos pais tiveram que partir. Sozinha no mundo, não desanimou e passou
a trabalhar ainda mais. Na sala de aula, levava as crianças a mundos extremamente
distantes, graças ao poder da leitura.
Mas,
como acontece a todos, a idade também a atingiu. Quando chegou à aposentadoria,
só a chamavam de Dona Celeste, apesar de insistir que não era dona de nada. “Nunca
tive filhos e nem ao menos pude andar de avião”, falou quando foi homenageada.
“Meus únicos bens são os livros, que me fazem viajar para onde eu quiser, e
meus alunos, que alçaram voos tão altos”, concluiu, emocionando a todos.
Em
um belo dia de Sol, Dona Celeste lia em sua casa quando notou pela janela um
daqueles riscos brancos no céu. Um ruído ensurdecedor atingiu seus ouvidos, e ela
interrompeu a leitura para ir lá fora ver o que era. Para seu espanto, um
enorme foguete estava pousando no seu quintal.
Maravilhada,
ela viu a porta da nave se abrir e um astronauta apareceu. “Bem vinda,
comandante”, disse. Ele lhe entregou um capacete espacial e, pelo reflexo, ela percebeu
que havia voltado a ser criança.
Mais
tarde disseram que Dona Celeste morreu lendo um livro. Mas eu tive a sorte de
ser um de seus alunos, e não acredito nisso. Para mim, Celestinha está lá no alto,
pilotando uma nave e deixando belos riscos brancos no céu azul.
Maravilhoso, fantástico, explêndido! Me faltam outros adjetivos para dizer o que achei deste conto. Super parabéns... novamente!!!
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