Na festa de réveillon, Ernest venceu
a timidez e finalmente se apresentou a Mary Ann. Conversaram animadamente,
riram e por fim beijaram-se sob os fogos de artifício. Para ele, aqueles minutos
sempre ficariam marcados por toda a sua magia. “O Céu deve ser assim”, pensou.
Eles ficaram juntos, casaram-se. Viveram
um sonho a dois, até que a rotina acabou por trazer-lhes à realidade. Porém, mesmo
diante de brigas, Ernest sempre voltava o pensamento para aquela doce menina
que beijara sob a chuva de fogos no céu.
Um dia, guardando o casaco da
amada, teve uma surpresa. Havia um pequeno bilhete no bolso, com uma letra que
não era a dele. “Deve ser um engano”, pensou. Mas aos poucos foi ligando vários
pontos, e concluiu algo que jamais esperaria dela.
Confrontá-la foi difícil. E assim
que se viu acusada, Mary Ann desabou e fez um apelo: “Perdoe-me!”. Estava
envergonhada.
Ernest passou dias calado, até
que a lembrança do primeiro beijo naquela virada de ano o fez decidir: “Te
perdoo, e prometo nunca mais falar sobre isso”. Mary Ann chorou e o abraçou muito
forte.
A vida continuou como a de um
casal unido e o episódio ficou no passado. As crianças vieram, assim como as
primeiras rugas e os cabelos brancos. Ernest, cumprindo a promessa, nunca
tocaria naquele assunto – nem mesmo quando, entristecido, achou evidências de
que havia sido enganado mais uma vez.
Um dia Mary Ann ficou muito doente.
No leito do hospital, afirmava que aquilo era seu castigo. Ernest, devoto de
sua promessa, desconversou, preferindo falar apenas sobre a noite em que se
conheceram: a troca de olhares, as frases desajeitadas, os risos, o primeiro beijo.
Ela morreu sentindo somente as dores
do corpo, porque os arrependimentos foram anestesiados por aquelas felizes recordações.
Viúvo, Ernest viveu dedicado à
memória da amada. Aos amigos, falava dela como de uma santa. Não cultuava a
mulher cheia de defeitos em que se transformou, e sim aquela mocinha ingênua do
dia em que se conheceram.
Em todo fim de ano, na noite de
réveillon, Ernest pedia para ficar sozinho na hora dos fogos. Sentado na sala,
olhos fechados, revivia aquele momento inesquecível da juventude. Enquanto recordava,
sentia os lábios tocando os dela, como na primeira vez. O mundo parava naquele
minuto, e então Mary estava com ele novamente, jovem, inocente, pura, feliz.
Enquanto durassem os fogos no céu, durava este sonho no sofá. E quando o
silêncio voltava a cair sobre a cidade, ele abria os olhos e voltava à vida, agora
com o som dos netos correndo pela casa e o champanhe estourando na cozinha.
Ernest sempre torcia para que os
fogos de artifício durassem bastante. Era tão bom poder sempre regressar àquela
noite especial, e prolongar indefinidamente aquele prazer indescritível.
Desta vez – “que maravilha!” – o
foguetório estava durando muito mais que o habitual.
“Bem que poderia continuar
eternamente”, pensou.
E o som incessante dos fogos
misturou-se ao agradável riso de uma mocinha.
-Já pode abrir os olhos, meu amor.
Ela estava ali, para todo o sempre.
Parabéns L.F. por mais uma linda e comovente estória; quem dera em todas as noites de réveillon todos nós pudéssemos fechar nossos olhos enquanto fogos de artifício iluminassem o céu... e as boas lembranças "iluminassem" nossas almas!!!
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