Estamos no início de um novo século, e
o que eu mais procuro à minha volta? Uma enceradeira. Parece palavra em outra
língua, mas em tempos passados foi um eletrodoméstico muito usado, que todas as
donas de casa conheciam. Servia para deixar o chão lustroso, porém não é esta a
razão pela qual a quero tanto.
Já entrei em mais de cem lojas de
antiguidades e ferros velhos, e como resposta só recebo os rostos emburrados
dos atendentes. Onde haverá uma última enceradeira elétrica neste canto do
mundo? Será que todas foram descartadas, como foram as geladeiras e os fogões?
Preciso muito daquela enceradeira.
Recordo muito bem o som que ela fazia, quando minha mãe a usava. E é a
lembrança desse som que me aflige. Preciso muito ouvir aquela música novamente!
Já inventaram a alimentação artificial,
os rejuvenescedores, a pele sintética e a vacina universal “contra todo o mal”,
como diz o slogan. Nem comer nós precisamos mais! Mas não criaram nada que se
compare à enceradeira elétrica.
Hoje em dia só morre quem quer. Ou
melhor: só morre quem não pode pagar. E aqui estou eu, completando minhas
duzentas e vinte e cinco primaveras. Mas me pergunto: pra que viver tanto, se
não consigo mais dormir?
Os comprimidos já não fazem mais efeito. O
único sonífero que funcionaria seria aquela deliciosa vibração que ecoava pela
casa todas as quintas-feiras, que era o dia em que minha mãe fazia a faxina.
A frequência sonora daquele motorzinho giratório que nenhum outro aparelho jamais igualou.
Já tentei de tudo: aspiradores de pó,
batedeiras, liquidificadores. Mas nenhum faz uma música de ninar tão suave como
a enceradeira que minha mãe usava. Não esqueço a sensação de sonolência que me
causava assim que o som tocava suavemente os meus ouvidos e arrepiava minha pele, obrigando-me a deitar no sofá
e a dormir o mais delicioso dos sonos, seguido de agradáveis sonhos
infantis.
É isso que eu busco nesses lugares,
meu amigo. Uma enceradeira igual àquela, pois de nada adianta continuar vivendo
sem poder sonhar.
sensacional!!!
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