quarta-feira, novembro 11, 2009

O Táxi (L.F. Riesemberg)

Mais um de minha autoria que ficou de fora de Grafias Noturnas, escrito em uma fase de vício em Ray Bradbury.

A mulher e a filha precisavam deslocar-se até uma loja em outro bairro, e para isso tomaram um táxi pela primeira vez na vida. Sentiram-se como duas celebridades ao esticar o braço e balançar a ponta dos dedos, assim que avistaram o carro amarelinho passando pela rua. Era como se milhões de pessoas as estivessem seguindo com os olhos e com flashes fotográficos enquanto as duas abriam a porta traseira do veículo e entravam.
Esta foi a última vez que foram vistas. Não por milhares de pessoas, nem por fotógrafo algum, mas somente pelo jornaleiro da banca da esquina. Foi a maior pista investigada para que pudessem ser encontradas.
O marido e pai ficou esperando a volta das duas, mas elas nunca chegaram à loja que iam. Também nunca voltaram para casa.
Simplesmente sumiram, sem deixar rastros, depois que entraram naquele carro.
Se ao menos aparecesse um pequeno sinal sobre o que, de fato, acontecera naquela tarde, o homem aliviaria sua angústia. O difícil era ficar sem saber.
A dúvida colocava um peso sobre a cabeça do pobre coitado, que o atormentava em noites e dias, e não o deixava viver em paz.
E se ao menos pudesse ter dado um abraço e um beijo a mais em cada um delas. Diria que amava as duas antes que saíssem de casa. Diria para tomarem cuidado. Diria para esperarem um pouco mais. Diria que iria junto com elas.
Mas era tarde.
Já eram dois aniversários desde que se foram.
Obcecado pelo destino dos dois seres que mais amava no mundo, foi até a esquina em que tomaram o táxi. Esperou passar o primeiro, e pediu que parasse. Entrou no carro e tirou da carteira uma foto das duas.
— Eu quero que me leve até onde elas foram.
Confuso, o motorista não entendeu.
— Me leve até elas, é só isso que quero — dizia o homem, sempre entre lágrimas ao ver o rosto delas na fotografia.
— Eu queria ajudá-lo, senhor, mas não posso fazer nada. Sinto muito.

O homem não desistiu e esperou passar um novo taxi. A mesma cena se desenrolou no interior do veículo amarelo. Ele mostrava as duas para o taxista, e pedia desesperadamente que fosse levado até elas, onde quer que estivessem.
— Ouviu bem? Qualquer lugar! Não quero me vingar de ninguém! Só quero encontrá-las de novo.
E a história se repetia todas as tardes. O homem virou uma figura folclórica trágica conhecida por cada vez mais motoristas. Sempre entrando no carro com suas cada vez mais profundas olheiras, os cabelos brancos precoces e a palidez funérea. Era um fantasma desesperado à procura do que havia perdido.
Mas nunca perdera a esperança de entrar no mesmo táxi que as levou embora. Sempre soube que, um dia, saberia o que havia acontecido.
Certa vez entrou em mais um táxi. Mostrou a foto ao motorista, e ele suspirou e fez um sinal afirmativo com a cabeça. O carro seguiu pelas longas ruas da cidade, em direção ao crepúsculo dourado no horizonte. Desta vez o homem tinha, mais do que nunca, a certeza de chegar ao seu destino querido, e recostou-se confortavelmente no assento, sonhador.
Enquanto o mundo lá fora passava como um risco pela janela, seus olhos sorriam em direção à mulher e à filha, eternizadas felizes no papel fotográfico.
— Eu estou indo até vocês, meus amores! — e agradeceu ao motorista pela viagem .

Um comentário:

  1. Riesemberg, que conto genial. Parceiro, acertou em cheio. Uma ficção científica soft. Parabéns. Posso publicá-lo no AB? Abração.

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