segunda-feira, junho 27, 2016

O Jardim de Inverno (L.F.Riesemberg)


Era finalmente sexta-feira. Benjamin caminhava sozinho pela calçada, olhando as árvores sem folhas e os gramados secos, sem acreditar que já era final de setembro. No calendário, a primavera já havia começado, mas o menino sabia que algo não estava correto.

Segundo Ben, o inverno só acabava quando as primeiras formigas de asas surgissem do pequeno buraco de algum gramado vizinho e saíssem voando pelos ares. Ele sempre achou fabulosa aquela imagem. Um pequeno esquadrão decolando de dentro da terra, batendo as asas pela primeira vez em direção ao sol.

Havia condições especiais para aquelas formigas brotarem do chão. Elas deviam esperar a temperatura exata, de um dia quente e úmido, sempre no final da tarde. E sua aparição era o anúncio de muitas alegrias depois dos meses de inverno: em breve viria o primeiro sorvete, as caminhadas noturnas em família, as limonadas com gelo, as poltronas na varanda, o assopro no primeiro dente-de-leão para suas pétalas se desfazerem no ar e caírem como pequenos paraquedistas...

O menino observava atentamente os gramados das casas, já com poucas esperanças de ver suas amigas aladas, pois sentia que aquele ainda não era o dia perfeito. Olhou com muito interesse os jardins de todos os vizinhos, exceto o de Ted, com quem não estava falando, e seguiu para casa.

Conformado, atravessou de cabeça baixa seu jardim seco e triste. A imensa árvore com galhos sem folhas, os canteiros vazios e a grama marrom lembravam mais um cemitério. Entrou e foi direto ao quarto, onde teria que continuar arrumando algo para fazer, já que a primavera não havia começado de verdade.

Ben estava inquieto, pois o próximo era o verão em que faria doze anos. O verão de sua vida. O último em que daria para cumprir todas as tradições da estação, cultivadas desde que se lembrava de estar vivo. Depois disso daria adeus a muitos hábitos, deixando morrer uma parte de si.

Ele podia não saber conscientemente disso tudo, mas era algo que seu coração mandava lhe dizer. E passar um dia a mais preso naquele quarto significava viver um dia a menos de estripulias, um dia a menos de explorações na vizinhança, de aventuras de bicicleta, de torneios de arroto, de risos no gramado verde e de picolés no bar da esquina.

Ficou olhando pela janela o vasto jardim, agora convertido quase em deserto, à espera de suave brisa que trouxesse a primavera. Se ao menos não estivesse de mal com Ted, algo de bom haveria a se fazer com ele. Mas desde que brigaram há algumas semanas, os dias passaram a ser longos e tediosos.

Na tarde de sábado, amargurado, Ben via a casa da frente, onde morava o ex-amigo, e imaginava o que ele estaria fazendo para passar o tempo. Na certa teria encontrado algo divertido, alguma poção mágica, um jogo novo ou um mistério insolúvel. Mas talvez estivesse também solitário, aguardando avidamente para que fizessem as pazes.

“Não vou mais falar com ele”, pensou Ben. Queria um amigo melhor. Além disso, poderia muito bem se virar sozinho. Seria ótimo que Ted visse, da janela do seu quarto, o quanto Ben ficava ótimo sem ele. De súbito pegou seus soldadinhos e correu ao árido gramado, onde criou pequenas barricadas com pedrinhas e iniciou uma guerra entre os dois exércitos. O início até foi divertido, mas com o jardim sem nada verde, não havia como os soldados se camuflarem, e logo aquela batalha se tornou cansativa e sem sentido.

Ben suspirou. Havia perdido a guerra.

“Posso falar com o Ted?”, disse o garoto à mãe do amigo, depois de apertar a campainha. A mulher sorriu e foi chamá-lo. “Ei, Ted, quer brincar lá fora?”. Seus olhares se cruzaram e imediatamente os meninos estavam reconciliados, sem necessidade de qualquer palavra para selar tal gesto. “Tá bem, vou pôr meu tênis”.

E, ao descer o degrau da varanda, Ben notou aquela acentuada mudança no ar, sempre cheia de significado. “Olha só”, apontou Ted. As formigas de asas estavam saindo do solo. “Vamos pegar algumas! Corra!”. E assim, finalmente, começou a primavera.

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