quinta-feira, setembro 11, 2014

Contos Fantásticos – O Horla e outras histórias (Guy de Maupassant)





“Eu quase cheguei a acreditar”. Eis a afirmação que resume muito bem os contos fantásticos tradicionais, produzidos no século XIX, dos quais o francês Guy de Maupassant é um dos maiores expoentes. Nesta coletânea Contos Fantásticos – O Horla e outras histórias (L&PM Pocket, vol. 24) podemos ler alguns dos melhores exemplares deste estilo de narrativa, escritos por um mestre das palavras que foi discípulo de outro grande mestre: Gustave Flaubert.

Assim como vários outros escritores de histórias góticas e sobrenaturais da época, Maupassant teve uma existência breve e atribulada. Toda sua obra — de mais de trezentos contos, alguns romances e peças de teatro — foi produzida em apenas dez anos, e ele teve uma morte prematura, aos 43, internado em um manicômio.

Hoje ele é tido como um dos maiores contistas de todos os tempos, e não escreveu apenas histórias fantásticas. Tanto que um de seus maiores sucessos é o conto Bola de Sebo, que eu tenho certeza que inspirou Chico Buarque a escrever a canção Geni e o Zepelin. Ok, mas hoje estamos aqui para falar de histórias de terror, e mais especificamente as deste livro de bolso, facilmente encontrado nas lojas.

Conforme o título destaca, a obra inclui O Horla, um dos textos mais celebrados da literatura fantástica mundial. E aqui constam as duas versões escritas por Maupassant: a primeira, linear, em que o caso é narrado posteriormente; e a segunda (e superior), em que acompanhamos o diário do protagonista e nos mantemos muito mais próximos dos fatos — o que aumenta o tom de urgência da trama, mostrando de perto a descida rumo à insanidade de um homem que se acredita vampirizado por uma criatura invisível que teria chegado a bordo de um navio brasileiro.

Além de toda a sofisticação da linguagem de Maupassant, este conto é um clássico porque, exatamente 10 anos antes do lançamento de Drácula, apresentou um monstro terrível, que tem a assustadora vantagem de nunca se mostrar para a vítima. Imagine ter sua casa invadida por uma entidade maléfica que não é um espírito, mas algo tangível, e que te atormenta de modo que você vai enlouquecendo e não consegue ter certeza se aquilo é real ou alucinação. Pelas minhas pesquisas, descobri que o conto é citado como inspiração para O Chamado de Cthulhu, de H.P. Lovecraft.

Mas nem só de horlas vivem os contos fantásticos de Maupassant. Na coletânea há ainda muita coisa boa, e quase tudo gira em torno dessa atmosfera de dúvida que ronda os personagens e o leitor: afinal, aquilo aconteceu ou foi tudo um mal entendido? Por exemplo, em histórias como O Lobo e Aparição, os relatos tanto podem ser interpretados como de fatos sobrenaturais, como de uma espécie de alucinação momentânea causada pelo medo.

A Mãe dos Monstros já é uma história com aquele terror real, sobre uma mulher que vive de deformar os filhos no próprio ventre, para criar aberrações e vendê-las a circos. Esta talvez seja uma das mais interessante do livro, que também traz, ainda que apenas sugestivamente, mortos saindo das covas (A Morta) e extraterrestres (O Homem de Marte).

Os contos fantásticos de Guy de Maupassant obviamente não contêm cenas sangrentas de demônios arrancando as vísceras das vítimas e coisas do tipo. Trata-se de literatura de classe, de alta qualidade, que pode até não ter nada de sobrenatural conforme a interpretação do leitor, mas que fará até mesmo o mais cético ficar em dúvida e (por que não?), sentir calafrios pela espinha.

Um comentário:

  1. Li esse livro quando estava no ensino médio e depois redescobri na biblioteca da universidade onde estudo.

    O conto principal é incrível e a forma com que ele estruturou essa história é simplesmente genial. A cena do espelho ainda me arrepia só de lembrar...

    Gostei do blog, ganhastes mais um leitor.

    ResponderExcluir